terça-feira, 10 de junho de 2008

Ele



Cheguei em casa enfadada, após caminhar bastante e sem querer muita conversa. Mas não era o meu dia de sorte. Mal cheguei deparei com ele, com cara de quem queria conversar.
Fingi que não o vi, ultimamente era comum ele vir me procurar, talvez por alguma coisa que minha mãe tenha falado que tenha dado alguma esperança a ele. Mas essa técnica de fingir não percebê-lo estava dando bastante certo nos últimos tempos.
Mas dessa vez parecia que ele não iria desistir tão fácil:
__Até quando você vai fingir que eu não existo? __perguntou ele, parecendo agastado e ofendido com minha falta de modos.
Permaneci em silêncio, ainda não havia reparado que ele estava realmente determinado a conversar.
__Você vai continuar mesmo fingindo que eu não existo?!__ Ele agora parecia um pouco irritado.
Continuei a ignorá-lo, quando ele segurou o meu braço, me puxando para perto dele.
__Nós não podemos ficar assim a vida toda! Você não pode ignorar a minha existência eternamente!
__Você que pensa... __respondi finalmente com toda a minha calma e paciência.
__Pelo menos você poderia falar o que eu fiz pra você?! Por favor! Eu posso desaparecer da sua vida pra sempre, mas pelo menos me diz o que eu fiz que te magoou tanto!
__O que você fez?! __Exclamei, perdendo a calma, e alteando o tom de voz, ao mesmo tempo que as lágrimas começavam a querer escapar, mas eu não permitiria que escapassem, não na frente dele.
Desvencilhei-me do seu braço e me afastei. Algumas lágrimas ainda se esvaíram, mas não permiti que ele as visse. O que mais me magoava era ele fingir que não sabia o que havia feito. Como ele poderia não saber?! Como?!
__O que você fez?! Você não sabe o que você fez?! Qual é o seu problema?!
__É, eu não sei. Nós sempre nos demos tão bem e do nada você começa a me ignorar. O que houve?!
__Do nada?! Como assim do nada?! A única coisa que aconteceu é que eu cansei. Cansei! Nós nunca nos demos bem! Você nunca foi totalmente sincero comigo! Você me iludiu com suas falsas promessas! Com suas promessas de amor verdadeiro, de príncipe encantado, amor eterno. Eu era uma criança, e você, junto com esses livros, filmes, músicas, novelas me fizeram acreditar que o amor existia e que eu o teria e viveria feliz para sempre!!! Mas eu descobri a tempo que era tudo mentira! E dei ouvidos à minha razão, em vez de entregar a minha vida e o meu destino a você.
__Do que você está falando, garota? Você não entende nada da vida. O melhor da vida é sonhar. Eu não lhe disse que tudo era verdade, apenas mostrei a você como é melhor encarar a vida do meu jeito, tudo fica mais bonito com a fantasia, até mesmo com a ilusão! Mas você, tão racional, quer concretizar o amor! O amor é abstrato! Foi você que nunca soube amar, com seu perfeccionismo e ostracismo nunca permitiu que o amor conhecesse você e que você conhecesse o amor. O amor não pode ser interpretado ao pé da letra e você jamais pode querer que ele seja perfeito.
__O amor é perfeito em sua imperfeição. Você não pode exigir tanto dele, nem querer que ele seja perfeito. Ele é construído por duas pessoas, o que você quiser que ele seja vai depender de você torná-lo nisso, com o consentimento do outro.
__Lá vem você de novo. Você acha que ainda me convence com essas suas filosofias baratas de livro de auto-ajuda. Por favor. Eu sou imune a você. Totalmente imune. Pode falar o que quiser, que não mudará em nada a minha opinião sobre você e sobre o amor e toda essa baboseira. __Disse eu, gritando, como numa tentativa de me fazer acreditar no que eu mesma falava. Era incrível como ele sempre vinha com o mesmo papo pra cima de mim, com algumas palavras mudadas, e eu sempre ficava na dúvida, me perguntando se aquilo era verdade, se aquilo podia ser verdade.
Mas acho que apesar das minhas incertezas, ele não percebeu qualquer fraqueza nos meus argumentos.
__Eu estava certo mesmo, acho que você ainda não está pronta para essa conversa. Fico tão triste por você ter ficado tão racional, como você mesma diz. Mas eu não vou desistir de você. Não desistirei nunca. Você é uma garota linda e um dia voltará a sonhar e eu serei o seu eterno companheiro.
Eu não respondi nada. Não havia o que responder. Apenas fiquei com uma angústia no peito quando ele foi embora, voltar a fazer sua clássica missão. O mesmo de sempre. Bombear sangue.

3 comentários:

KarinaK disse...

eiiii... aplaudida de pé!!!
EXCELENTE texto, Jérula...
fazia tempo que vc naum escrevia um texto tão incrível.

Porra, uma conversa (quer dizer, um bate-boca) com o próprio coração. Que show!!!!

Bjaum

Vida Mágica já atualizado!

Lucas disse...

Muito show esse post, desde o inicio eu desconfiava q era o coracao, acho q pela imagem... xD

Ah, nao consegui terminar de ajeitar la ainda, mas o texto ja ta pronto: O Apanhador no Campo de Centeio

www.oapanhador.blogspot.com

Filipe Veras disse...

Oo